quinta-feira, setembro 29, 2005

O que será ser velho?

Há uma altura em que uma coisa justa e boa - como a socrassanta tentativa de se salvar uma vida, por exemplo - se converte de repente em teimosia cruel. A omnipotência da ciência raramente respeita o ser humano que se oculta na "patologia" da velhice.
Falei da ciência, mas deveria ter falado de toda a sociedade "civilizada". Vivendo aqui, vivendo neste mundo cada vez mais frenético e afastado das raízes da verdade, tem-se muitas vezes a impressão de que a velhive já não existe. Não existe nos jornais e nem nas revistas de capas lustrosas, não existe na publicidade ( os velhos consomem poucos produtos e, em muitos casos, dada a exiguidade das reformas, não consomem mesmo nada), não existe no imaginário daqueles que são jovens.

Ninguém pergunta: como é que serei, quando for velho? Como viverei? Como serei aceite pelas pessoas que estão à minha volta?
Ninguém se pergunta: serei amado, respeitado, ou serei posto de lado como um trapo velho? Como algo que já não serve para nada e, como inútil que é, deita-se fora? Vive-se nesta frenética e cada vez mais longa juventude, uma juventude que é como um elástico, vai-se puxando cada vez mais; e quando o elástico já não pode ser mais esticado, recorre-se a outras técnicas: manda-se cortar, coser, repuxar.

Qual é este medo tremendo da própria aparência? De se reconhecer ao espelho mesmo com as rugas? De deixar-se viver cada idade como se fosse única e tão boa como todas as outras? O medo da morte é terrível e para não o aceitarmos sujeitamo-nos às coisas mais incríveis.
Para se manter a fidelidade ao dever da juventude perpétua, engolem-se mezinhas, aumenta-se a "fitness": as nádegas têm de ser firmes, as faces, também. Enquanto tudo estiver firme, está-se salvo. E eu pergunto, e a verdadeira felicidade onde está?

A velhice está fisiologicamente perto da morte, e é por isso que à sua volta se cavam trincheiras, é por isso que ao depararmos por acaso com um velho, desviamos instintivamente o olhar.
O que sucede aos velhos? Não importa. Como é que vivem? Não importa. Não consomem, não produzem, passam a vida doentes, fisicamente não são sedutores, não se reproduzem, o seu futuro como eleitores é bastante limitado. São um peso, uma chatice, um estorvo social.


Quando penso na nossa sociedade, vem-me por vezes à ideia uma grande barca que anda à deriva. Uma sociedade que rejeita o mistério da morte é uma sociedade perigosamente suspensa no vazio, flutuante. Se a morte não existe, nada existe, não há uma relação de valor entre as coisas, as acções deixam de ter fundamento, deixa de haver memória, deixa de haver passado e presente.
A sociedade que nos é proposta é a que se descreve num único fotograma em que todos sorriem. Sorriem de quê? Sorriem porquê? Ninguém sabe, ninguém diz. Tem de se olhar bem, com atenção, para reparar que não é um sorriso, é um trejeito, o trejeito apavorado de quem está num lugar e não sabe porquê.

quarta-feira, setembro 28, 2005

Se...

Hoje morreu alguém muito querido, o pai de uma grande amiga minha. Em vez de deixar um poema sobre a morte, quero antes deixar algo sobre a vida! Que a percepção da realidade do morte nos faça deixar de ter medo da vida!
Se...
Se tu podes impor a calma, quando aqueles
Que estão ao pé de ti a perder, censurando
A tua teimosia nobre de a manter.

Se sabes aguardar sem ruga e sem cansaço.
Privar com Reis continuando simples,
E na calúnia não recorres à infâmia
Para com arma igual e em fúria responder.
- Mas não aparentar bondade em demasia
Nem presumir de sábio ou pretender
Manifestar excesso de ousadia, –

Se o sonho não fizer de ti um escravo
E a luz do pensamento não andar
Contigo no domínio do exagerado.

Se encaras o triunfo e a derrota
Serenamente, firme, e reforçado
Na coragem que é necessário ter
Para ver a verdade atraiçoada.
Caluniada, espezinhada, e ainda
Os nosso ideias por terra, – As erguê-los
De novo em mais profundos alicerces
E proclamar com alma essa Verdade!,
Se perdes tudo quanto amealhaste
E voltas ao principio sem um ai,
Um lamento, uma lágrima, e sorrindo
Te debruças sobre o coração
Unindo outras reservas à vontade
Que quer continuar, e prosseguindo
Chegar ao infinito da razão.

Se a multidão te ouvir entusiasmada
E a virtude ficar no seu lugar.

Se amigos e inimigos não conseguem
Ofender-te, e se quantos te procuram
Para estar com o teu esforço não contarem
Uns mais dos que os outros, – olha-os por igual!,

Se podes preencher esse minuto
Com sessenta segundos de existência
No caminho da vida percorrido
Embora essa existência seja dura
Á força das tormentas que a consomem,
Bendita a tua essência, a tua origem
- O Mundo será teu,
E tu serás um Homem!

Rudyard Kipling (1865-?)
Versão portuguesa de António Botto
Em memória de Vìtor Lopo (1940-2005)

domingo, setembro 25, 2005

Desordem e Degradaçao

Pensem no seguinte: Porque é que um copo que cai ao chão se parte? Porque é que os seus pedaços nunca voltam a juntar-se para formar o copo? Porque é que um cubo de gelo em água quente derrete e arrefece a água, e a água morna nunca aquece para formar um cubo de gelo? Estas questões aparentementemente inocentes levaram a física a um dos seus mais importantes princípios com vastas consequências cósmicas. Para responder, vamos recorrer à Termodinâmica:

A Primeira Lei da Termodinâmica (ou Princípio da Conservação da Energia) diz que a quantidade de energia no Universo permanece constante. Contudo, se fizermos saltitar uma bola no chão, ela salta cada vez menos até parar, vai perdendo a sua energia mecânica. Para onde foi essa energia? Temos, então, que introduzir uma nova grandeza: a Entropia. A Entropia é um conceito vasto e com muitas definições, mas que, na realidade, são a mesma. Vamos defini-la, por enquanto, como a medida da energia que se perde num processo. No caso da bola, a Entropia é a energia que se perde sob a forma de som, aquecimento das superfícies, etc. Toda essa energia perdida é que faz com que a bola pare de saltar. Essa energia não está, de facto perdida, mas não é utilizável; não é possível voltar a aproveitar a energia sonora para fazer a bola saltar, ou seja, é energia de "má qualidade". A Entropia é, portanto, uma medida da degradação da energia.

É na Segunda Lei da Termodinâmica que está o cerne da questão. Esta diz-nos que a Entropia aumenta sempre, em qualquer processo. Isto significa que a energia existente no Universo se degrada a cada momento, e, ainda que permaneça constante, a porção de energia que pode ser utilizada vai sempre diminuindo. A degradação da energia representa um aumento da desordem, na medida em que, todos os sistema evoluem no sentido de aumentarem a desordem, dispersando energia.
Podemos, então, definir Entropia como uma medida da desordem de um sistema, ou como uma medida negativa de informação (quanto maior a desordem, menor a informação que eu tenho sobre um sistema).

Com isto, já podemos explicar que, quando partimos um copo, a energia utilizada para o partir, não pode ser recuperada para o reconstruir. Quando derretemos o gelo, a energia utilizada não pode ser recuperada para voltar a aquecer a água. Ou seja, é o aumento constante de Entropia que estabelece a irreversibilidade dos processos e, em última análise, a passagem do tempo. A segunda lei da termodinâmica estabelece a seta do tempo, estabelece o que é passado e o que é futuro. E mais, quando se diz que o aumento de Entropia traduz uma degradação da energia um aumento da desordem, estamos a estabelecer e a provar que o Universo tem um fim no tempo.

Hoje (ou qualquer outro dia)














Não gostei deste dia… Não que os anteriores me tenham agradado assim tanto, ou que espere ansiosamente pelos que hão-de vir, mas sinto que não gostei de hoje, nem sequer fiz um esforço para tal e estou zangada comigo por isso mesmo…
Todos os dias são iguais, sim a Lua deita-se, o sol nasce, o mundo acorda, vai trabalhar e no fim volta a casa naquela hora mágica cujo cansaço não permite absorver… mas, há algo que podemos fazer! Existem pequenas coisas que podemos fazer ou dizer para que o nosso dia não igual a todos os outros. Alias, há imensas coisas, imensamente significantes que podemos fazer para que o nosso dia se torne diferente de ontem e de amanhã.
Ah! Mas não podemos esperar que esses momentos de magia surjam simplesmente ou mesmo que caiam do céu só para nos! Temos de nos esforçar, temos de nos preocupar, temos de não nos esquecer que cada dia pode ser o último, e que cada dia poder ser O decisivo, aquele em que determinado gesto ou determinado atitude pode mudar o curso da nosso vida… e hoje não me lembrei disso, e hoje não fiz nada para que o meu dia fosse diferente, ou ainda pior, para que o dia daqueles que estavam à minha volta fosse diferente ou, de forma alguma, especial…
Mas, na verdade, pensando bem, se calhar é preciso que existam dias assim, dias em que nos esquecemos, dias em que nada fazemos. Se calhar é preciso que haja dias assim, dias que são dias simplesmente, dias cujas horas correm ao longo dos minutos sem nos darmos conta de nada, se calhar estes dias são precisos para que nos dias seguinte nos lembremos com mais valor que cada minuto pode ser o mais importante da nossa existência e que a cada segundo o rumo da nossa vida muda.
Já vejo hoje de modo diferente, hoje serviu para que soubesse que ontem foi um dia importante e que amanha poderá ser ainda mais. Hoje serviu para que não me esquecesse que o tempo não pára à espera de mim.

(10 de Março de 2004)

O céptico


As expectativas da vida, quando em excesso, geralmente desmoronam-se e resultam no "jogo céptico". A pessoa que foi programada para pensar que o universo foi talhado em função do seu próprio conforto, sofre sempre um choque doloroso com a realidade.Neste ponto, ataca com o seu cepticismo.
Basicamente, o céptico é um irrealista desmoralizado. As coisas não saíram como ele queria, e descarrega nos outros a sua desilusão. Não pode confiar em ninguém. Todo o sistema é corrupto. Enquanto desempenhar o papel de céptico, não terá de olhar honestamente para si mesmo ou para o seu mundo; nem terá de sentir a dor do ajuste à realidade.
A sua zombaria é geralmente um sistema de antagonismo encoberto; não encontrou a vida como desejava.Nunca aprendeu a ser empático ou tolerante e nunca experimentou uma afeição verdadeira por alguém.
Como consequência, é uma pessoa solitária por trás do seu sorriso malicioso.

sábado, setembro 24, 2005

A hiper-protecção e o medo

Há uns anos atrás, precisamente no mês de Outubro, fui dar um passeio pela montanha com uns amigos. Na montanha, o Outono oferece, por vezes, dias extraordinários e, de facto, esse domingo era um deles. O céu estava límpido, o ar levemente agreste, os áceres e as faias alegravam a paisagem com os tons de vermelho, laranja e amarelo das folhas. A temperatura devia andar pelos 15/18 graus, uma camisa e uma camisola de malha eram mais do que suficientes para nos sentirmos protegidos.
Passados uns 20minutos de caminho, vimos à nossa frente uma família. Mãe, pai e dois filhos novinhos. Iam de fatos berrantes, pau na mão, e pareciam avançar a grande custo, como mergulhadores no solo lunar. Só quando os ultrapassámos é que percebi qual era o motivo. Estavam todos enfaixados em fatos de esqui acolchoados, mais próprios para os rigores de Inverno do que para aquele dia morno de Outubro.

Os miúdos levavam luvas e gorros de lã enfiados até às orelhas. Quando passei pelo mais pequeno, vi-o, cara roxa de calor, esboçar um tímido gesto de revolta e correr o fecho do fato. "Estás doido?", gritou-lhe logo a mãe. "Queres apanhar uma pneumonia? Não vês que estamos na montanha?" Por que é que me lembrei deste episódio?
Porque essa tal família não andava a passear para se deliciar com o grandioso espetáculo que lhe era oferecido pela natureza, mas para lutar contra o frio que se costuma associar à palavra "montanha". Não estava frio nenhum, mas eles lutavam na mesma. E provavelmente, ao 3º, 4º ou 5º passeio, aquele miúdo vai acabar mesmo por adoecer, não por causa do frio, mas pela forma imprópria e malsã como o obrigavam a lutar contra o grande inimigo inexistente.

Quantas vezes nos comportamos assim na nossa vida?
Quantas energias desperdiçamos para combater "monstros" que só existem na nossa cabeça?
E enquanto combatemos esses monstros, enquanto estamos distraídos, somos assaltados pelos monstros verdadeiros, aqueles que não tínhamos previsto. A vida civilizada habituou-nos a subestimar o grande poder do nosso corpo. Basta pensar, por exemplo, na vida dos nossos avós ou bisavós, na enorme dureza das suas existências, sem automóveis, sem electricidade, sem elevadores, etc., para percebermos até que ponto a imagem de nós mesmos se modificou. Agora, qualquer esforço, por mais pequeno que seja, aterroriza-nos. O corpo trabalha pouco e a cabeça, muito. Tenha sérias dúvidas de que a cabeça seja mais sábia do que o corpo.
Quando vou à piscina ou à praia, mete-me sempre pena ver a quantidade de crianças que já parecem velhas, sem brilho, sem alegria nos olhos. Há muitas, demasiadas, que são superalimentadas, são gordas e mexem-se com um certo embaraço. Olho para elas e penso: "Mas o que é que se passa? Será que não vêm o que lhes estão a fazer?". Penso que se devia tentar compreender rápidamente esta mudança.
Em suma, compreender porque é que se nota que as pessoas, logo desde a infância, se sentem mal consigo mesmas, são alheias ao seua próprio corpo.

Se crescem assim, é porque no terreno há uma falha qualquer. Qual será?

quinta-feira, setembro 22, 2005

Horizonte


"Aqui sentada, onde o horizonte não tem fim, descubro as mais rebeldes fantasias que o mar me confidencia! Não sei, não quero, não posso largar esta sensação, para não me perder como uma magia desvairada que ninguém agarrou...
Presa ao meu sentimento de liberdade deixo-me levar pelos sons, pelo movimento do vento, pelo raiar do sol na minha face... Foi o que o coração me ensinou e é assim que vou permanecer! Como uma brisa sem definido começo nem fim!"


Sara Meireles (1985-?)

Hoje decidi partilhar estas palavras, escritas por alguém que tem a sensibilidade na alma e a irreverência no corpo... Alguém que é sincera na sua pessoa mas medrosa em partilhar o seu Eu; alguém cuja beleza não consegue ser escondida pela máscara diária, por muito que ela por vezes tente!
Dedico este post a ti,
Sara

quarta-feira, setembro 21, 2005

Real Imaginário








É triste pensar que enquanto construímos nossos sonhos, nossos projectos imaginários, nossos caminhos reais... Outros sonhos, planos e vontades são destruidos pela ajuda inexistente...

Não permitamos que a alegria e o sorriso existam apenas na imaginação... Tornemo-los reais!

Para isso basta ajudar clicando aqui uma vez por dia. No topo encontram-se 5 separadores, ajude-se quem precisa!

segunda-feira, setembro 19, 2005

Uma história a ter em conta

Esta história foi me enviada por e-mail como tantas outras que na sua maioria não têm o mínimo de interesse, mas, no entanto, esta foi uma surpresa tão inesperada, fascinante e emocionante que decidi partilhar com todos aqueles que visitam o meu blog, mesmo que já a tenham conhecido.
É difícil um e-mail surpreender-me desta forma (porque normalmente até tão aquelas tão famosas frases "Enviam a 10 amigos blá blá", mas neste caso não) e, por isso mesmo, quero tocar tantos outros como me tocaram a mim...

"Dois homens, ambos gravemente doentes, estavam no mesmo quarto de hospital.Um deles podia sentar-se na sua cama durante uma hora, todas as tardes, para que os fluidos circulassem nos seus pulmões. Sua cama estava junto da única janela do quarto. O outro homem tinha de ficar sempre deitado de costas.
Os homens conversavam horas a fio. Falavam das suas mulheres, famílias, das suas casas, dos seus empregos, dos seus aeromodelos, onde tinham passado as férias... E todas as tardes, quando o homem da cama perto da janela se sentava, ele passava o tempo a descrever ao seu companheiro de quarto todas as coisas que conseguia ver do lado de fora da janela.

O homem da cama do lado começou a viver à espera desses períodos de uma hora, em que o seu mundo era alargado e animado por toda a actividade e cor do mundo do lado de fora da janela. A janela dava para um parque com um lindo lago. Patos e cisnes chapinhavam na água enquanto as crianças brincavam com os seus barquinhos. Jovens namorados caminhavam de braços dados por entre as flores de todas as cores do arco-íris. Árvores velhas e enormes acariciavam a paisagem e uma ténue vista da silhueta da cidade podia ser vista no horizonte.

Enquanto o homem da cama perto da janela descrevia isto tudo com extraordinário pormenor, o homem no outro lado do quarto fechava os seus olhos e imaginava a pitoresca cena. Um dia, o homem perto da janela descreveu um desfile que ia a passar, embora o outro homem não conseguisse ouvir a banda, e conseguia vê-la e ouvi-la na sua mente, enquanto o outro senhor a retratava através de palavras bastante descritivas.

Dias e semanas passaram.
Uma manhã, a enfermeira chegou ao quarto trazendo água para os seus banhos, e encontrou o corpo sem vida do homem perto da janela, que tinha falecido calmamente enquanto dormia. Ela ficou muito triste e chamou os funcionários do hospital para que levassem o corpo. Logo que lhe pareceu apropriado, o outro homem perguntou se podia ser colocado na cama perto da janela. A enfermeira disse logo que sim e fez a troca. Depois de se certificar de que o homem estava bem instalado, a enfermeira deixou o quarto.

Lentamente, e cheio de dores, o homem ergueu-se, apoiado no cotovelo, para contemplar o mundo lá fora. Fez um grande esforço e lentamente olhou para o lado de fora da janela...que dava, afinal, para uma parede de tijolo! O homem perguntou à enfermeira o que teria feito com que o seu falecido companheiro de quarto lhe tivesse descrito coisas tão maravilhosas do lado de fora da janela. A enfermeira respondeu que o homem era cego e nem sequer conseguia ver a parede. "Talvez ele quisesse apenas dar-lhe coragem...".

Moral da História:
Há uma felicidade tremenda em fazer os outros felizes, apesar dos nossos próprios problemas. A dor partilhada é metade da tristeza, mas a felicidade, quando partilhada, é dobrada. Se te queres sentir rico, conta todas as coisas que tens que o dinheiro não pode comprar.
"O dia de hoje é uma dádiva, por isso é que o chamam de presente."












Rodei a cabeça e vi o outro lado.

Não havia verde.
A relva secara, o prédio caíra
O jardim morrera, a flor murchara
A esperança… desaparecera.

Não havia azul.
A água poluída, o tempo estagnado
O céu pesado, a vontade corroída
Os olhos… já fechados

Rodei a cabeça e vi o teu mundo.

Não havia olhares, já se tinham desiludido
Não havia palavras, já se tinham esgotado
Não havia luta, já estava perdida
Não havia vidas, o esquecimento já as apagara

E, no entanto,
Teus olhos azuis falaram-me palavras de verdade,
A ilusão verde da esperança ainda não a tinhas esgotado
E as marcas do teu caminho… teimavas em não as esquecer.

Teus olhos azuis
Mostraram aquilo que meu coração aceitou ver
E, apesar de não ter ouvido a tua voz,
Sei que a sua doçura me levaria a voltar a acreditar no mundo.

quarta-feira, setembro 14, 2005

Cultura oriental


Graças à minha paixão pela cultura oriental, consegui ver em acção alguns mestres de artes marciais. Eram homens de idade avançada; quando estavam parados, até podiam parecer uns velhotes que mal se tinham nas pernas, mas, quando se mexiam, tudo mudava: havia um vigor e uma elasticidade nos seus corpos que nunca vi em nenhum jovem. É fácil e cómodo pensar que essas "prestações" são fruto de uma qualquer poção mágica ou de algum truque de feira de aldeia.

A realidade é muito mais simples: por detrás daquela velocidade, por detrás daquele equilíbrio, há um longo trabalho interior, porque o que nos faz permanecer jovens durante muito tempo é a força de espírito, e não a força de músculos. Se aos oitenta anos sou capaz de dobrar a coluna, isso significa que também sou capaz de flectir os meus pensamentos, significa que ainda sei admirar-me e deslumbrar-me, significa que, ao longo dos anos, em vez de julgar, soube escutar, recusando as adulações do poder, soube manter o coração puro.
Significa que tive confiança no que há de sagrado no meu corpo e no que há de sagrado no meu espírito e que os cultivei com respeito e atenção, os fiz crescer a ambos como uma única planta.
Dentro de todos nós há força, dignidade, energia, dentro de todos nós há uma pantera muito pequena mas muito bonita, que só está à espera de poder mostrar-se.

Se assim é, por que havemos de continuar a deixar-nos viver e não deixar de uma vez a pantera soltar-se?

terça-feira, setembro 13, 2005

A alegria


Cultivar a alegria não é tapar os olhos para não ver as coisas feias e os dissabores do mundo, não é cobrir a realidade com um véu cor-de-rosa para criar uma felicidade ilusória; pelo contrário, viver na alegria é viver na consciência extrema, testemunhando, na escuridão do mundo, que o nosso ser pertence a algo de diferente.

A alegria não é uma linguagem de palavras, é uma linguagem de olhares, a alegria não convence, contagia.
A alegria é poderosamente subversiva, porque é subversivo o amor sem distinções que ela transmite.

domingo, setembro 11, 2005

A forma justa



"Sei que seria possível construir o mundo justo
As cidades podiam ser claras e lavadas
Pelo canto dos espaços e das fontes
O céu o mar e a terra estão prontos
A saciar a nossa foma de terrestre
A terra onde estamos - se ninguém atraiçoasse -
proporia
Cadia a cada um a liberdade e o reino
- Na concha na flor no homem e no fruto
Se nada adoecer a própria forma é justa
E no todo se integra como palavra em verso
Sei que seria possível construir a forma justa
De um cidade humana que fosse
Fiel à perfeição do universo
Por isso recomeço sem cessar a partir da página em branco
E este é o meu ofício de poeta para a reconstrução do mundo"

Sophia de Mello Breyner Anderson (1919-2004)

sábado, setembro 10, 2005

A semana de férias


Voltei...
Estas férias foram extremamente enriquecedoras. Aprendi a valorizar novamente as coisas realmente importantes e encontrei sobretudo fonte de paz e inspiração.
Apesar de inicialmente desanimada devido a condições de limpeza e asseio que para mim são fundamentais, conseguimos finalmente acomodar-nos estabelecendo um meio de satisfação a todos. Em sintonia, revemos novamente os planos, os objectivos e o que nos fez á partida seguir em tamanha aventura.
Despertamos então para um caminho inexplorado em busca de algo que nos desse um certo equilíbrio, tentando involuntáriamente assemelhá-lo ao que obtemos diáriamente com as nossas vidas citadinas.
Vi que isso era impossível porque nem o meio nem as culturas eram as mesmas...habituamo-nos assim ao que tinhamos nas mãos e demo-nos muito bem.

Saiamos todos os dias para dar um passeio sempre diferente, sem rumo traçado e desfrutar do bom tempo, do ar agreste que nos enchia os pulmões e da natureza selvagem que nos envolvia. Cada um tinha o seu tempo, cada um dava o devido tempo aos outros respeitando cada passo dado em conjunto. Não nos atropelavamos com os pensamentos ou com as nossas fúrias de ir mais além...afinal não tinhamos pressa de chegar a lado nenhum. Tivemos momentos de silêncio, de euforia, de diversão, de descanço... até mesmo de cansaço... mas todos eles recheados com imensa descoberta e aprendizagem.
Aproveitei então o meu tempo para pôr alguns pensamentos em dia, para meditar... Equilibrar a minha própria mente e libertá-la da confusão.
Quando voltava para casa, o Sol já tinha quase desaparecido, mas a sua luminosidade permanecia; os cipestres, os pinheiros e os carvalhos são silhuetas quase escuras e o céu assume todas as cores da mudança: um fio dourado no horizonte e depois o azul transparente, o azul mais forte, o azul-claro, o azul-anilado da noite, as estrelas que se acendem uma a uma e a Lua que, ainda pálida, paira sobre todas as coisas. Embora este espectáculo se repetisse todos os dias, nunca me cansei de o contemplar e de sentir uma grata estupefacção. Correr ao encontro das primeiras luzes do crepúsculo passou a ser a minha forma de meditar. "O que é a meditação? Como é que se pratica?", perguntaram-me, por mais do que uma vez, alguns amigos curiosos. As minhas respostas contumavam deixá-los desiludidos. Se calhar, estavam à espera de fórmulas ou rituais complicados, e não de aparente simplicidade de uma disposição de espírito.

Nestes tempos confusos e contraditórios, há uma grande necessidade de nos aproximarmos da parte mais verdadeira e profunda de nós mesmos, mas muitas vezes falta-nos capacidade para nos orientarmos, para percebermos qual é o caminho que devemos escolher. Prosperam os mestres e os que se dizem mestres, os especialistas em felicidades terrenas e ultraterrenas, os cursos e os estágios que prometem a aquisição de todos os poderes possíveis e imagináveis, desde o toque que cura até às viagens extracorporais. Há qualquer coisa de incrívelmente infantil em tudo isto, ou não?

A vida interior deixou de ser um caminho, algo que se deve enfrentar dia após dia com a lucidez de espírito e de coração da idade adulta, e transformou-se num pozinho mágico que, a troco de dinheiro, alguém que se autodenominou "mestre" derrama por cima de nós. Paga-se, espera-se e o resultado acabará seguramente por aparecer. Como tudo isto está longe da minha ideia de meditação!

Pode-se meditar enquanto se está a fazer o café, a lavar os pratos, a fazer compras no supermercado, ou a escrever e a ler, como eu faço todas as tardes.

Meditar é, ao mesmo tempo, muito fácil e muito difícil. Podem usar-se dezenas de fórmulas e técnicas diversas, e não se chegar a parte alguma, e também não se pode usar nenhuma dessas fórmulas ou dessas técnicas e vivê-la totalmente. A meditação é, acima de tudo, um estado de "presença" e não - como se tenta fazer crer - de abstracção. Meditar é estar-se presente em si mesmo, na vida e para as pessoas que nos rodeiam, presente no mistério que nos une.

De facto, pensamos muitas vezes que estamos presentes e não estamos, vivemos no meio dos outros, fechados no nosso isolamento sensorial como um mergulhador dentro do seu escafandro. Vivemos prisioneiros das nossas ideias acerca da realidade, não na realidade. Todos os nossos sentidos - o ouvido, o tacto, a vista - estão literalmente anestesiados pela dança de roda das ideias.

Pensamos constantemente no que deve ser e no que não deve ser, no que foi e no que será. Na nossa cabeça, há um tropel contínuo de recordações, hipóteses, opiniões e esperanças que nos impedem de viver o presente. Mas o tempo da vida - o único tempo verdadeiramente real - é o presente. Dedicar-se à meditação é, em primeiro lugar, aprender de novo a ver, aprender de novo a ouvir. Só quando tivermos enveredado por este caminho de reeducação é que perceberemos o pouco que temos visto e o pouco que temos ouvido.

Assim, lentamente, a nossa vida ir-se-á tornando cada vez mais rica. Rica não de milagres ou de viagens extrasensoriais, mas de atenções dadas e de atenções recebidas. O tédio e a ansiedade desaparecerão e sentiremos que somos criaturas que agem num universo onde a realidade primeira é a do amor.

quarta-feira, setembro 07, 2005

A infância da Humanidade

Desde que o Homem começou a desvendar os mistérios à volta de si e do seu meio, a necessidade de explicar todos os fenómenos observados tornou-se urgente. E é esta urgência tão primária de iluminar o desconhecido que mantêm o ser humano colectivo presa à infância e não o deixa evoluir.
Durante o 2º Estádio do desenvolvimento Psicossocial da criança, o estádio Pré-Operatório (dos 2 aos 7 anos), o “pensamento corresponde a uma acção interiorizada, assente na capacidade simbólica (…) a principal característica deste estádio, ao nível do pensamento, é o egocentrismo que se define pelo entendimento pessoal de que o mundo foi criado para si e pela incapacidade de compreender as relações entre as coisas (…) a criança está autocentrada.”
Uma vez que, até então, todas as necessidades básicas tais como fome, sede, sono, etc., são constante e instantaneamente satisfeitas, a criança acredita que a ocorrência de todos os fenómenos é para a satisfação plena e imediata das suas necessidades e desejos numa visão egocêntrica, animista e finalista da realidade. Assim, surgem explicações em que são atribuídas emoções e pensamentos a objectos inanimados como “ O Sol levanta-se”, “A Lua deita-se” e explicações dos fenómenos naturais como se fossem produzidos para lhes servir como todos os outros objectos: “ O Sol existe para me aquecer quando tenho frio”, “ A noite vem para eu ir dormir”, “A areia está na praia para em brincar”, etc.
Analogamente, a explicação que a Humanidade foi globalmente aceitando para os fenómenos que ia observando, baseou-se num elevado egocentrismo; Inicialmente com os deuses múltiplos, o Homem acreditava que a sua vida não se justificaria senão para os agradar, estando estes atentos a cada passo, a cada gesto. Uma boa acção teria então uma recompensa como uma boa colheita ou um período livre da ira da chuva, por exemplo. Ou seja, os deuses serviriam para assistir o Homem. Posteriormente, com o aparecimento da igreja, tudo se tornou mais simples de explicar, surgindo até a resposta para a razão da existência humana: Deus terá criado, num acto de inspiração divina, o universo e o mundo com toda a fauna e flora nele existentes, e colocado lá o Homem para o cuidar. O sol serve para iluminar, aquecer e permitir agricultura, os animais servem para o Homem se alimentar, a noite serve para terminar o dia e dar descanso, etc., tendo cada ser humano determinada e específica missão incógnita.
Esta visão limitada da existência humana e do meio em que este se encontra, não é mais do que a infantil forma como a criança, não sabendo o que vê, o explica como tendo alguma utilidade para ela própria. Porém, a criança não tem capacidade ainda, nem conhecimentos, para formular diferente explicação. Então porque razão, quando se torna adulta, não a reformula? Porque o ser humano, de tão habituada a olhar o céu e ver uma semiesfera forrada de negro veludo com alfinetes brilhantes colocados, não é capaz, de forma alguma, aceitar que a vastidão do universo é de tal forma imensa, que a importância da sua existência é nula.
E isto é simplesmente esmagador.

terça-feira, setembro 06, 2005

Sorte e Acaso II

No último texto (Sorte e Acaso) terminei com a ideia de, devido ao Princípio da Incerteza, não ser possível determinar com exactidão as propriedades de uma partícula ao nível quântico. Assim, não seria possível fazer previsões sobre o futuro comportamento de um sistema de partículas, já que o seu estado num determinado momento não é determinado. Contudo, é possível fazer um cálculo probabilístico, ou seja, eu não sei onde está a partícula, mas sei qual a probabilidade de estar em determinado local num determinado momento. Isto faz parecer que a natureza se comporta de uma forma aleatória, mas, de facto, permite-nos fazer previsões exactas. Eu posso não conseguir saber se uma partícula está num local ou noutro, mas consigo saber, de um conjunto de partículas, exactamente quantas estão num local e quantas estão no outro.
Um exemplo: tenho um vidro que reflecte 50% da luz que nele incide com determinado ângulo. Não consigo saber se um fotão em partícular vai ser reflectido ou não, mas sei que exactamente metade é reflectido. Por isso, parece que a natureza, apesar de funcionar de forma aparentemente aleatória ao nível das partículas elementares, é regulada por leis que permitem ter certezas sobre a evolução de um determinado sistema, ainda que essas leis sejam o resultado de cálculos probabilísticos. Este é, actualmente, o modelo aceite como base para aquilo que se chama "o Modelo Standard", que é a teoria que explica todos os fenómenos da natureza, à excepção da gravitação. Actualmente procura-se alargar o Modelo Standard também à gravidade, o que permitirá termos uma teoria que explique todos os fenómenos da natureza. É algo que já não está muito longe e que terá consequências dramáticas para a nossa concepção do Universo, para a filosofia e para as religiões.

sábado, setembro 03, 2005

Férias

Descanço, paz, serenidade, sintonia, alegria, euforia, amizade... União. É o que caracteriza umas férias perfeitas, em conjunto com amigos que nos compreendem e que são compreendidos.

É verdade, finalmente vou de férias durante 10 dias.
Já nem sabia o que isso era...mas não interessa, agora há que aproveitar bem.

No entanto, não me despeço aqui porque o blog não vai ficar parado. Vou entrega-lo, durante esta temporada, a duas pessoas bem competentes: o Aeroespacial e a 100asas.

Bom trabalho para ambos e até breve para todos os que viajam até este blog.

quinta-feira, setembro 01, 2005

Sinto...

Hoje sinto-me assim...
Irredutível, inconstante, incontrolável.
Quero sair daqui...
Ir ao encontro dos meus semelhantes,...
Os espectros da alvorada,
Os demónios da terra que não souberam onde se enfiar.
Todos aqueles insatisfeitos para quem a diferença entre o dia e a noite
Se apagou na monotonia do sofrimento,
Da agonia, do desespero do pensamento.
Eu aqueço, ardo, consomo-me!
Quero mudá-los...mas sou só uma...uma inconformada!
Surpreende-me olhares furtivos,
Plenos dum ardor insaciável.
Serei consumida por uma cólera furiosa
E brevemente colheram os frutos preciosos do meu ímpeto.
Tentarei novamente...sim, não desisto...
Mas mais tarde...

O todo coração

Acredita-se que também aqui a formação de reacção é responsável pela preocupação excessivamente amável e sentimental da pessoa. É uma compensação subconsciente pelas suas tendências sádicas (cruéis). Todos nós temos inclinações cruéis, algumas vezes, mas esta pessoa fica especialmente amedrontada diante disso.

Um dado importante sobre a compensação é que, uma vez iniciada, quase sempre resulta em supercompensação. Por alguma razão, a programação desta pessoa a tornou incapaz de entrar em contacto com ela mesma e de admitir as suas inclinações hostis; com efeito ela gasta a maior parte da sua energia a negar a verdade que não pode admitir. É provável que seja excessivamente carinhosa com os animais, sentimental e indulgente com as crianças, demonstrando afecto e amabilidade em excesso.

Segue o seu coração em todas as situações, a ponto de os outros se perguntarem se a sua cabeça funciona em algum momento das suas decisões. O coração decide tudo. Manifesta todos os tipos de emoção suave; raramente ou nunca expressa emoções desagradáveis porque é, exactamente, destas que teme e por isso as reprime. As mulheres são mais inclinadas a este tipo de "formação de reacção" porque a nossa sociedade programa-as para acreditarem que emoções hostis e cruéis são particularmente terríveis numa mulher. Por isso, evita toma-las e culpa-se constantemente quando as toma.

Por vezes, é díficil lidar com estas pessoas porque, na sua grande maioria, são pessoas irrealista que sofrem ao mínimo contacto com situações sérias ou desconfortáveis nas quais é necessário estabelecer um raciocínio coerente e reflexivo; e vivem sistemáticamente na ilusão do seu mundo cor-de-rosa do qual não querem sair.