quinta-feira, novembro 27, 2008

aqueles dias

compreendo e entendo que há sempre aqueles dias . quando se sai de casa e se fecha a porta e se apercebe nesse preciso momento de que tudo vai correr mal . ou pelo menos, nada vai correr bem . há sempre aqueles dias em que nos cruzamos com as pessoas na rua e um ligeiro desconforto nos percorre uns bons centimetros do corpo, não sei se por desconhecer a vida ou por a conhecer bem demais. 

e no entanto há sempre tempo e vontade de saborear um café naquilo que é a ingénua esperança de que, afinal, o som da porta a fechar não tenha passado de um mal-entendido. queima-se os dedos com a chávena escaldada e tem-se a certeza (pelo menos essa! ) de que mortos não estamos . depois vem a incontornavel questão se não teria sido melhor ter chegado a uma outra conclusão.

compreendo que há sempre aqueles dias em que se sobe a rua encasado para proteger do frio que nos poderia bem levar para longe daqui e para outros destinos, e quando se chega lá acima é-se invadido pela sensação clara de que se pertence a qualquer outro lugar menos ali .

e no entanto os pés continuam a caminhar sozinhos procurando encontrar aquele que seria o local menos imperfeito. mas o silêncio trémulo não o permite e há sempre aqueles momentos em que as personagens dos outros filmes perturbam as correntes cerebrais.

veste-se a pele de quem se quer e se imagina e calça-se aquele sorriso comprado em saldos que representa nada mais que uma boa compra . as boas compras deixam-nos sempre orgulhosos por retirarem da consciencia o peso do consumismo puro e passa-se as horas seguintes preenchido por um fantastico sentimento de maioridade . 

come-se algumas porções aquecidas e reconhece-se no passar dos segundos, os instantes dormentes das horas que se arrastam naquilo que secretamente desejávamos ser uma corrida . e ganha-se coragem para erguer as pernas e dizer que basta daqueles minutos . já deram o que tinham a dar e é preciso reabrir aquela porta mal-fechada . os bancos andantes levam-nos de volta a casa e quando a porta se abre o sentimento de alivio invade-nos. sabe-se que está perto do fim. 

compreendo e entendo que há simplesmente aqueles dias em que o pão duro ratada de manha , só nos faz recordar a insignificância da existência de si .

e, no entanto, são estes os dias que me fazem sentir melhor .

domingo, novembro 02, 2008

Insónias


Luzes passam por buraquinhos infinitos num amanhecer e anoitecer qualquer.
Crepúsculos enraivecidos cirandam numa dança sem rumo definido. Chamam por mim. Aceno-lhes! Não posso...não poderei!
O meu corpo está imóvel numa cama a arder de enfermidade.
Limito-me a ouvir... sim limitar-me-ei a ver com os ouvidos. Um silêncio que se emprenha é mortífero mas acalma.
Uma janela que não dá para sítio algum bate bruscamente. Alguém que está perto faz barulhos estranhos e ruidosos enquanto parece dormir.

Ahh...um carro!! Sim, oiço o motor de um carro! Virá para aqui? Será que aqui é o seu destino? Vem-me buscar imploro-te...leva-me contigo para outro mundo que não este...leva-me para aquele que tu tão bem conheces de caminhos distantes e desconhecidos e que tu vais quando bem te apetece porque tu podes! Anda só mais um pouco!! Isso!! Não, não vem...continua a sua marcha lenta para outra direcção, com outro destino numa estrada longínqua.
Não desistirei. Não hesito e esforço-me para ouvir os sons do mundo, da vida, dos outros.
No entanto, nesta frenética loucura, o tempo esgota-se e eu canso-me, eu choro-me, eu acalmo.me, eu durmo!

Um novo amanhecer virá...e um outro anoitecer também!