domingo, dezembro 17, 2006

Afinal, para que serve o Natal?

Não sei o que significa para si o Natal. Para mim o Natal significa Passagem de Ano.


Quando eu era pequena, onde eu vivia não havia Natal, havia apenas o Ano Novo. No entanto havia prendas e havia um pinheiro decorado com papel colorido, biscoitos, rebuçados e tangerinas. As pessoas juntavam-se para festejar! Viam todos os anos, a mesma comédia que passava na televisão. À meia-noite saíam para as varandas ou subiam aos telhados dos prédios para ver o fogo de artificio. E toda a cidade gritava em coro “Urra!!!”. Depois desciam todos à rua e andavam de trenó até não poder mais, e a neve que entrava pela gola do casaco parecia quente. As prendas não vinham em papel de embrulho colorido cheias de laços. Lembro-me de receber, enrolado em papel de jornal, um sabonete e uma pasta de dentes. Lembro-me também de fazer papel marmoreado com a minha mãe para colorir as prendas de Ano Novo.

O pai natal chamava-se avô gelo, e aparecia vestido de azul, numa carroça trenó puxada por cavalos brancos. Tinha uma neta que o ajudava a distribuir as prendas e enfeitar as casas e os vidros com ornatos de gelo.


Em Portugal é tudo diferente, as prendas dão-se no Natal. O Natal significa reunião de família. A minha família cá, eram pessoas que mal conhecia. Nunca entendi por que razão tinha que abdicar de estar com todas aquelas pessoas amigas, de quem gostava na Rússia. Ter que estar agora com gente que não conheço, que nunca senti gostarem de mim. Por que razão não iam todos, brincar para a rua depois da festa? Eu não gostei do Natal! Gostava da Passagem de Ano. Era uma festa divertida, estavam todos juntos para se divertirem!

O primeiro Natal foi um choque. Depois tornou-se numa rotina anual. Trocávamos de ano para ano. Num ano passava a véspera com a minha mãe e a família do meu padrasto, e o dia de natal com o meu pai e a família da minha madrasta, no ano seguinte era ao contrário. De qualquer das formas era uma maçada. Depois mudaram os tempos, o Natal continuou a ser uma maçada. Chegaram os anos em que ninguém me convidava para passar o Natal. Passei o Natal com uma família que não era minha, que não me transmitia nada para além da piedade de não me deixarem passar o Natal sozinha. E era o que eu mais queria, passar o Natal sozinha.


Enquanto era criança havia a magia dos presentes. Não de receber mas de dar. Sempre adorei dar presentes. Fazer uma lista, comprar presentes a pensar nas pessoas que os iriam receber, e depois ficar ansiosa à espera que chegasse o dia de os oferecer e ver as pessoas felizes que os iriam abrir. Não sei por que razão, conforme fui crescendo os meios financeiros para os presentes desapareceram. Desapareceu a magia do Natal quando deixei de poder ver as pessoas a abrirem os meus presentes, junto com outros, quando deixei de abrir os meus presentes junto com os outros.

Voltei à Rússia, voltou aquela Passagem de Ano. Mas os tempos mudaram, voltou-se a festejar o Natal na Rússia. As pessoas já não sabiam em que altura é que deviam oferecer os presentes. O Ano Novo era festejado com a mesma alegria. As pessoas continuaram a sair à rua para festejar a chegada do novo ano, porém infiltrou-se um veneno. Será que alguém entende o que é realmente o Natal? Por que razão é que para a maioria das pessoas o Natal é um frete? É uma correria porque é preciso escolher presentes e não se sabe o que se vai oferecer. È uma preocupação porque os avós vêm do campo passar este tempo em casa da família dos filhos que moram na cidade e é preciso arranjar lugar para eles em casa.


É uma separação porque os filhos devem estar ao mesmo tempo com o pai e com a mãe que já não estão juntos. É uma fadiga porque é preciso preparar os comeres da festa e há sempre alguém que se enfia na cozinha e quando chega a hora da ceia morre de cansaço, porque depois das festas é sempre preciso arrumar o que se desarrumou. É um abalo da rotina diária. O Natal é um aumento de tarefas nas vidas das pessoas que, já assim, mal conseguem gerir o seu tempo. E o que fazem as pessoas? Em vez de aproveitarem este tempo como uma escapatória da rotina, encaram-no como um frete. Em vez de se juntarem todos na cozinha e se divertirem a fazer a ceia, isolam-se dizendo que “dá tanto trabalho”. Só se juntam à mesa, e já nem sabem do que falar porque a única coisa de que querem falar é da vida difícil que levam. Mas neste dia não é “suposto” falar de coisas tristes, é “suposto” dizer uns aos outros que se ama o próximo e a vida. Então, dizem-no mas não o sabem sentir, repetem as mesmas frases feitas que soam a plástico. E mesmo querendo mostrar o coração raramente o mostram, porque já se tornou costume dizer palavras pré fabricadas nesta época.



Do ponto de vista religioso o Natal é a festa do nascimento de Jesus. Para mim os factos descritos no evangelho ou na bíblia não são importantes. O que é importante é a imagem. O que significa para nós o nascimento de Cristo, o que devemos festejar? Com o nascimento de Cristo temos uma nova era. Diz-se que antigamente as pessoas eram mais cruéis. Este nascimento separa o velho testamento do novo testamento. Marca uma evolução da humanidade, um aumento do grau de consciência das pessoas. Eu digo que para mim o Natal significa Passagem de Ano. Significa deixar para trás tudo o que está gasto, largar aquilo que não se realizou neste ano. É uma oportunidade de dizer às pessoas que não receberam a devida atenção da minha parte, que ainda me lembro delas, e que estou feliz. É ver para além do que não se fez, aquilo que realmente foi bom este ano e valorizar o que se fez. É estar contente por poder desejar um dia feliz a pessoas que provavelmente não tiveram direito a uma única palavra durante todo o ano. Sem remorsos porque o importante é hoje, não devíamos estragar o que pode ser bom hoje por aquilo que aconteceu ontem. O Natal finaliza o ano, é neste dia que nos reunimos e partilhamos tudo aquilo que fizemos desde o último Natal, com os nossos entes mais queridos.

Este ano ganhei e perdi. E foram tão grandes as perdas como os ganhos. Este ano não vou comprar prendas de Natal. Este ano vou dar às pessoas de quem gosto aquilo que tenho de mais valor: as palavras que traduzem o que eu sinto por elas.

Penso que as crianças entendem o que é realmente o Natal!



 

2 Comments:

Blogger Alice said...

o Natal é como um boneco de neve, derret quando passa o frio

12/18/2006 1:04 da manhã  
Blogger ManiacaDosPorques said...

"O Natal é o que cada um faz dele."
Bela frase, não é?

Uns juntam-se c entes que mal conhecem e que nao tem qualquer tipo de afectividade. Outros ligam-se a familias que os acolhem. Outros juntam-se com amigos e com aqueles que sao verdadeiramente importantes na sua vida, e isto nao significa que sejam do mesmo sangue. OUtros simplesmente nao comemoram o Natal...ou pelo menos segundo a tradiçao portuguesa.

Mas todos eles tem uma maneira de partilhar os seus sentimentos e emoçoes... mesmo que esses signifiquem troca de prendas. É um especie de magia...que faz-nos impor a nossa presença e a nossa existencia nesta vida.

Mas agora retirando toda a hipocrisia nestas palavras lindas que disse anteriormente... o Natal perdeu o seu valor na medida em que se transformou numa epoca muito pouco festiva cheia de velhotas fofoqueiras e deprimidas que refilam de cada parte do corpo que lhes doi, de pessoas sem gosto em tar onde estão prontas a fugir ao primeiro sinal de alarme, crianças que tentam animar a festa de alguma maneira, uma sala a transbordar de familiares que a tornam cheia de conversas chavão ou de comentarios despropositados e desprovidos de conveniência que sao preenchidos com um "Quem quer sobremesa?" para terminar o desconforto e seguir para o proximo prato que parecem nunca mais acabar e sim...esse mesmo Natal ( que nao varia muito de familia para familia...pelo menos portuguesa) é principalmente revestido por interesses e por um consumismo intrinseco puro.

Pessoas tornam-se animalescas, crianças lutam pelo melhor brinquedo, pais compram 30 000 presentes aos seus filhos...os avós claro idem aspas! E o espirito natalicio será que ainda sabem o que quer dizer??? Será que ainda sequer existe??

Onde está o entendimento mutuo, a compreensão, os carinhos fundamentais ao nosso bem estar, as palavras sinceras vindas do coraçao?? Onde está afinal de contas a sinceridade?

Sera que ate no Natal o nosso viver tem de ser uma farsa...com um sorriso pepsodente fixo na cara como um fotografia de album??

Nao sei quanto a ti minha querida amiga Alice...mas a mim já me dava jeito senti-lo mais uma vez...ja que a ultima vez que o senti foi quando me disseram k o Pai Natal nao exitia e me tornei consciente do mundo!!

Beijinhos muito grandes de alguem que te compreende...e que principalmente adora a tua maneira de escrever!! ;)

12/19/2006 12:36 da manhã  

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